No litoral fluminense, bilionário constrói porto e quer atrair empresas de aço, cimento, carro, produtos Apple, além da cidade .
A ponte mede quase três quilômetros de comprimento. Nasce em solo arenoso e avança sobre o mar adentro. Está montada sobre 662 estacas fincadas no fundo da água que se enfileiradas teriam a distância de 38 quilômetros. Sua estrutura tem a largura de 27,5 metros, que permitirão não só a passagem de uma gigantesca correia de transporte de minério de ferro como também a circulação de caminhões pesados.
Na ponta da ponte em alto-mar, a temperatura supera os 30 graus. O forte vento reduz a sensação térmica, mas deixa o mar agitado. As primeiras pedras lançadas para a construção do quebra-mar já começam a aparecer na superfície e vão proteger os navios que chegarão no futuro porto que está sendo construído. Ao todo, serão lançados 1,8 milhão de metros cúbicos de blocos de pedras no mar, o equivalente ao morro do Pão de Açúcar.
Quando estiver pronto, o porto acomodará dez berços de atracação. O calado natural de 15 a 18 metros já seria suficiente para navios Panamax, nas medidas que cruzam o canal do Panamá. Mas as obras de dragagem vão aumentar a profundidade para 25 metros, o que inclui a nova geração de meganavios Chinamax, com capacidade carga de mais de 350 mil toneladas de minério, que hoje chegam apenas a poucos portos existentes no mundo.
A obra Superporto do Açu começou no fim de 2007. Até sua conclusão, prevista para 2012, receberá investimentos de R$ 4,5 bilhões. Mas o porto e a estrutura para o transporte do minério serão uma migalha se comparados a todos os projetos sonhados pelo empresário para a região.
Se o plano idealizado por Eike Batista se materializar, os investimentos - um complexo industrial integrado às atividades portuárias além de um megaempreendimento residencial para acomodar dezenas de milhares de pessoas - vão transformar São João da Barra, município com 32 mil habitantes do litoral norte fluminense, numa verdadeira “Eikelândia”.
O Superporto do Açu é o cartão-postal mais vistoso dos empreendimentos do oitavo homem mais rico do mundo, segundo ranking da revista “Forbes” divulgado em março de 2010. Quase todas as empresas do grupo EBX, o conglomerado empresarial criado pelo multibilionário, composto por uma sopa de siglas todas com a palavra “xis”, têm planos de investimentos no complexo, que fica a pouco mais do que três horas de carro da cidade do Rio de Janeiro.
A empresa de logística LLX responde pelas atividades portuárias; a de energia MPX planeja construir duas usinas térmicas, uma movida a carvão importado (2.100 MW) e outra a gás (3.330 MW), similar à oferta de energia firme de Itaipu; a empresa de construção naval OSX prevê instalar seu estaleiro. A OGX é outra potencial candidata a ter uma base local: a empresa de petróleo e gás tem direitos na exploração de blocos na bacia de Campos, a menos de 300 quilômetros da costa.
O grupo empresarial de Eike Batista já teve mais coisa na área do complexo do Superporto do Açu, mas vendeu. A MMX, empresa de mineração de Eike, tinha montado um sistema que incluía a exploração de uma mina em Minas Gerais, o mineroduto de 500 quilômetros para o carregamento da matéria-prima até Açu, onde será beneficiado e transportado pelo porto ao exterior. Mas juntamente com outro projeto no Amapá, Eike Batista vendeu o negócio por US$ 5,5 bilhões para a Anglo American, uma das maiores do setor no mundo. A mineradora Anglo continua com as obras no complexo, e o prazo de conclusão é o mesmo ano quando houver a finalização do porto.
Além dos negócios próprios, o plano para a Eikelândia contempla a instalação de outros grandes empreendimentos. Numa área de 90 quilômetros quadrados, equivalente a cidade de Vitória (ES), o bilionário brasileiro pretende atrair duas siderúrgicas – uma já assinou contrato com os chineses da Wisco, uma das três principais produtoras de aço do país asiático.
A outra foi fechada com os ítalo-argentinos da Ternium-Techint, um dos maiores fabricantes de aço da América Latina. Cada uma das siderúrgicas terá fábricas de cimento como vizinha - a Votorantim e a Camargo Corrêa, as duas maiores empresas brasileiras do setor, já assinaram acordos de intenção de investimento com as empresas de Eike.
O empresário já indicou seu interesse em atrair uma montadora de carros. Toyota? Suzuki? Essas são as marcas especuladas pelos moradores da região. Carro chinês? Carro elétrico? O Nano? O nome não é revelado pelo empresário em suas entrevistas ou mensagens pelo Twitter. Pouco se sabe sobre boa parte dos 60 memorandos de entendimentos assinados pelas empresas de Eike, que não abre as informações alegando por questões de confidencialidade.
Para completar o conjunto de projetos, indignado pelo fato de o consumidor brasileiro pagar mais do que o dobro para ter acesso um iPad, o bilionário empresário disse que gostaria de atrair uma fabricante de produtos da Apple para sua “Eikelândia”. O investimento total é estimado em US$ 36 bilhões.
Equipamentos pesados
Guindastes gigantescos, caminhões pesados novíssimos, estradas de acesso recém-asfaltadas. Aos poucos, a paisagem está sendo drasticamente redefinida pelas novas construções. Os canteiros de obras ocupam espaço em fazendas dedicadas antes à pastagem.
Moradores do município contemplam a obra como se estivessem em um grandioso parque de diversões, vendo a Disneylândia pela primeira vez. A LLX, a empresa responsável pelo porto, mantém um programa de recepção local e registra mais de 2 mil visitas anuais, o que dá quase 10% da população.
A entrada é monitadora por segurança privada. Depois de percorrer uma estrada de terra, cercada por uma vegetação rasteira, passa-se um heliponto até chegar à recepção, uma construção ao melhor estilo das mansões de praia: ampla, com pé direito alto e iluminação natural.
Um gramado que cerca a construção e é servido por um sistema de irrigação torna o ambiente um oásis no meio do solo pouco fértil desta região conhecida como Açu, que fica no 5º Distrito, no parte sul do município de São João da Barra. No ambiente com ar condicionado, que contrasta com o calor abafado do lado de fora, o painel exposto na parede impressiona pela quantidade de construções do complexo porto-indústria.
À frente dele, uma maquete, recentemente desatualizada pela decisão de erguer o estaleiro ali, que era disputado também por Santa Catarina. A construção tem ainda uma sala de cinema para pelo menos 50 pessoas, onde é projetado um filme os negócios do empresário, amplos banheiros, escritório e um pequeno alojamento. As pessoas que trabalham ali são simpáticas e atenciosas e exigem o cuidado com as normas de segurança numa obra desta magnitude.
Um vídeo com a imagem aérea da ponte dá a dimensão exata da grandiosidade. A ponte de três quilômetros do porto já atraiu a atenção de jornalistas do mundo inteiro. A rede de TV CNN sobrevoou a estrutura do porto de helicóptero. O jornal “Washington Post” esteve aqui chamando a atenção de que o empreendimento está saindo do chão por conta do interesse chinês em obter recursos naturais – minério de ferro é o principal deles.
Superporto do Açu: Metade da mão de obra contratada para as obras vem da região; Quando os projetos estiverem prontos, promessa é gerar 50 mil postos de trabalho
Na maioria das apresentações realizadas para investidores, a ponte é mostrada como o caminho para o
desenvolvimento de uma região, que deve gerar 50 mil empregos diretos quando tudo estiver pronto, segundo números divulgados pela empresa.
No estágio atual da obra, trabalham cerca de 2,5 mil pessoas, das quais mais da metade da região, principalmente nas funções mais básicas. Engenheiros e técnicos mais especializados foram “importados” e ocupam boa parte das pousadas da região.
As projeções divulgadas pela prefeitura indicam que a população de São João da Barra irá crescer dos atuais 32 mil para cerca de 250 mil pessoas em um prazo de até 15 anos. A prefeitura lançou um plano de obras de infraestrutura, com investimentos de R$ 80 milhões para os próximos anos, que inclui redes de água e esgoto.
Seis postos de saúde, cinco creches, duas novas escolas foram construídos. Abriram-se vagas para o ensino técnico voltado, por exemplo, para operadores logísticos e metal-mecânico. Além disso, 180 alunos estão tendo aulas de mandarim para comunicar-se com os chineses que vão trabalhar numa das duas siderúrgicas esperadas no complexo industrial.
Não à subhabitações
Para atender a demanda, a prefeitura calcula a construção de 84 mil novas unidades habitacionais. “Estamos nos preparando para atender esse forte crescimento e desenvolver o pessoal que aqui está”, diz a prefeita de São João da Barra, Carla Machado (PMDB). Mas ela adverte que não quer que o município acomode bolsões de pobreza, com o surgimento de favelas. “Quem vier para cá e se estabelecer em barracos será retirado”, afirma.
Para acomodar o crescimento populacional, o grupo EBX decidiu criar, do zero, a “cidade X”, uma área anexa ao complexo porto-indústria. O empreendimento tem meta de atender 250 mil pessoas, embora a prefeitura avalie que não será para mais do que 150 mil habitantes. Será desenvolvido pela REX, a empresa imobiliária da Eike.
Para tanto, o empresário convidou o arquiteto e urbanista Jaime Lerner, ex-governador do Paraná, para criar uma cidade modelo. “A ideia é garantir habitação com infraestrutura, de modo que o crescimento urbano seja planejado e ecologicamente sustentado”, explica a empresa. Uma das propostas em estudo é o uso de bicicletas e de carros elétricos. “Não queremos também que a cidade X seja um condomínio fechado”, diz a prefeita. “Não é possível ter um município fragmentado.”
Bebida milagrosa
Por anos, São João da Barra viveu de atividades pesqueira, pecuária e agrícola, como a cana de açúcar - até a falência das usinas existentes na vizinha Campos de Goytacazes. Tornou-se durante os anos 1970 e 1980 nacionalmente conhecida por causa da propaganda de um conhaque de alcatrão, fabricado pelo grupo Thoquino, conhecido como “o conhaque do milagre”, capaz de curar os males dos enfermos por artrite.
“Era a maior empresa de destilados do Brasil, até a entrada das companhias estrangeiras”, diz Victor Aquino, secretário de Planejamento de São João da Barra e um dos mais de 100 herdeiros do grupo de bebidas. “Fazia muito sucesso. Chegou ao “Guiness Book”, o Livro dos Recordes, como o conhaque mais vendido no mundo em número de doses”, orgulha-se Aquino, que, em seguida, faz a ressalva: “conhaque bom mesmo é vendido em garrafa”.
Atualmente, o município vive da atividade de turismo, com a vinda de hordas de mineiros para as praias de Atafona e Grussaí - curiosamente, o maior hotel do município, com 600 quartos, é o Sesc, de Minas Gerais, cuja cidade mais próxima fica a cerca de 200 quilômetros.
Mas o que mais gera receita e mantém a cidade é a receita oriunda dos royalties do petróleo retirado do campo de Roncador, um dos maiores da Petrobras, na bacia de Campos. As transferências de recursos garantem cerca de R$ 200 milhões do orçamento anual de R$ 250 milhões a ser realizado em 2010.
Arrecadação em crescimento
A prefeitura já nota aumento na arrecadação com o ISS, o imposto sobre serviços, por conta das transformações geradas pelo Porto de Açu. Em 2007, a receita com ISS foi de R$ 1,6 milhão, valor que chegou a R$ 8 milhões no ano passado. “Apenas o estaleiro do Eike vai gerar mais R$ 35 milhões em recursos próprios ao município”, diz Aquino, confiante de que o empreendimento dará à cidade de São João da Barra independência financeira. A prefeitura já prepara uma atualização do mapa de georeferenciamento para fixas novas cobranças de IPTU e ISS.
Victor Aquino, secretário de Planejamento de São João da Barra: "novo" Eldorado
Aquino diz que São João da Barra vive uma fase de “novo Eldorado” brasileiro. Ele nasceu em Campos, nunca trabalhou na fábrica da família e mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro há três décadas para estudar e trabalhar como arquiteto.
Conheceu Eike Batista quando o empresário fez um investimento na área de saúde e convidou o arquiteto para fazer um projeto de consultórios hospitalares. Há três anos, fascinado com o Superporto do Açu, Aquino decidiu voltar à região de São João da Barra e ajudar a implantar o empreendimento de Eike.
“Sou uma espécie de Severino, ajudando a destravar tudo”, brinca. “Aqui as oportunidades existem. Quem for um bom profissional se dará bem”, diz. Quando sair da prefeitura, ele mesmo espera colher essas oportunidades com seu negócio na área de arquitetura “Espero ganhar muito dinheiro no futuro, obviamente não serei um bilionário como o Eike”, diz.
O primeiro shopping da cidade começa a sair da maquete. A SuperBom, uma rede de supermercados de Campos, acena com a abertura de uma filial na cidade vizinha. A cidade tem duas agências bancárias, uma do Banco do Brasil e outra do Itaú. A Caixa Econômica Federal deve abrir uma filial, assim como se espera o mesmo do Bradesco e Santander.
Determinadas cidades nascem da junção de pessoas com empresas que buscam explorar seus recursos naturais. A mineira Ipatinga era uma cidade de 3 mil pessoas que cresceu à sombra da siderúrgica Usiminas. A cidade fluminense de Volta Redonda nasceu com a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). As duas cidades são consideradas exemplos do desenvolvimento industrial brasileiro.
Mas há casos de tremendo fiasco. Henry Ford, o empresário que revolucionou a indústria automobilística, criou uma cidade do zero no meio da floresta Amazônica para extrair das seringueiras o látex utilizado na fabricação de pneus aos carros que vendia nos Estados Unidos. A “Fordlândia” durou pouco mais de 15 anos e virou uma cidade abandonada perto de Santarém, no Pará. Delírio ou não da mente dos empreendedores, o tempo vai dizer se Eike Batista concretizará os projetos empresariais, transformando São João da Barra na sua “Eikelândia”.
A ponte mede quase três quilômetros de comprimento. Nasce em solo arenoso e avança sobre o mar adentro. Está montada sobre 662 estacas fincadas no fundo da água que se enfileiradas teriam a distância de 38 quilômetros. Sua estrutura tem a largura de 27,5 metros, que permitirão não só a passagem de uma gigantesca correia de transporte de minério de ferro como também a circulação de caminhões pesados.
Na ponta da ponte em alto-mar, a temperatura supera os 30 graus. O forte vento reduz a sensação térmica, mas deixa o mar agitado. As primeiras pedras lançadas para a construção do quebra-mar já começam a aparecer na superfície e vão proteger os navios que chegarão no futuro porto que está sendo construído. Ao todo, serão lançados 1,8 milhão de metros cúbicos de blocos de pedras no mar, o equivalente ao morro do Pão de Açúcar.
Quando estiver pronto, o porto acomodará dez berços de atracação. O calado natural de 15 a 18 metros já seria suficiente para navios Panamax, nas medidas que cruzam o canal do Panamá. Mas as obras de dragagem vão aumentar a profundidade para 25 metros, o que inclui a nova geração de meganavios Chinamax, com capacidade carga de mais de 350 mil toneladas de minério, que hoje chegam apenas a poucos portos existentes no mundo.
A obra Superporto do Açu começou no fim de 2007. Até sua conclusão, prevista para 2012, receberá investimentos de R$ 4,5 bilhões. Mas o porto e a estrutura para o transporte do minério serão uma migalha se comparados a todos os projetos sonhados pelo empresário para a região.
Se o plano idealizado por Eike Batista se materializar, os investimentos - um complexo industrial integrado às atividades portuárias além de um megaempreendimento residencial para acomodar dezenas de milhares de pessoas - vão transformar São João da Barra, município com 32 mil habitantes do litoral norte fluminense, numa verdadeira “Eikelândia”.
O Superporto do Açu é o cartão-postal mais vistoso dos empreendimentos do oitavo homem mais rico do mundo, segundo ranking da revista “Forbes” divulgado em março de 2010. Quase todas as empresas do grupo EBX, o conglomerado empresarial criado pelo multibilionário, composto por uma sopa de siglas todas com a palavra “xis”, têm planos de investimentos no complexo, que fica a pouco mais do que três horas de carro da cidade do Rio de Janeiro.
A empresa de logística LLX responde pelas atividades portuárias; a de energia MPX planeja construir duas usinas térmicas, uma movida a carvão importado (2.100 MW) e outra a gás (3.330 MW), similar à oferta de energia firme de Itaipu; a empresa de construção naval OSX prevê instalar seu estaleiro. A OGX é outra potencial candidata a ter uma base local: a empresa de petróleo e gás tem direitos na exploração de blocos na bacia de Campos, a menos de 300 quilômetros da costa.
O grupo empresarial de Eike Batista já teve mais coisa na área do complexo do Superporto do Açu, mas vendeu. A MMX, empresa de mineração de Eike, tinha montado um sistema que incluía a exploração de uma mina em Minas Gerais, o mineroduto de 500 quilômetros para o carregamento da matéria-prima até Açu, onde será beneficiado e transportado pelo porto ao exterior. Mas juntamente com outro projeto no Amapá, Eike Batista vendeu o negócio por US$ 5,5 bilhões para a Anglo American, uma das maiores do setor no mundo. A mineradora Anglo continua com as obras no complexo, e o prazo de conclusão é o mesmo ano quando houver a finalização do porto.
Além dos negócios próprios, o plano para a Eikelândia contempla a instalação de outros grandes empreendimentos. Numa área de 90 quilômetros quadrados, equivalente a cidade de Vitória (ES), o bilionário brasileiro pretende atrair duas siderúrgicas – uma já assinou contrato com os chineses da Wisco, uma das três principais produtoras de aço do país asiático.
A outra foi fechada com os ítalo-argentinos da Ternium-Techint, um dos maiores fabricantes de aço da América Latina. Cada uma das siderúrgicas terá fábricas de cimento como vizinha - a Votorantim e a Camargo Corrêa, as duas maiores empresas brasileiras do setor, já assinaram acordos de intenção de investimento com as empresas de Eike.
O empresário já indicou seu interesse em atrair uma montadora de carros. Toyota? Suzuki? Essas são as marcas especuladas pelos moradores da região. Carro chinês? Carro elétrico? O Nano? O nome não é revelado pelo empresário em suas entrevistas ou mensagens pelo Twitter. Pouco se sabe sobre boa parte dos 60 memorandos de entendimentos assinados pelas empresas de Eike, que não abre as informações alegando por questões de confidencialidade.
Para completar o conjunto de projetos, indignado pelo fato de o consumidor brasileiro pagar mais do que o dobro para ter acesso um iPad, o bilionário empresário disse que gostaria de atrair uma fabricante de produtos da Apple para sua “Eikelândia”. O investimento total é estimado em US$ 36 bilhões.
Equipamentos pesados
Guindastes gigantescos, caminhões pesados novíssimos, estradas de acesso recém-asfaltadas. Aos poucos, a paisagem está sendo drasticamente redefinida pelas novas construções. Os canteiros de obras ocupam espaço em fazendas dedicadas antes à pastagem.
Moradores do município contemplam a obra como se estivessem em um grandioso parque de diversões, vendo a Disneylândia pela primeira vez. A LLX, a empresa responsável pelo porto, mantém um programa de recepção local e registra mais de 2 mil visitas anuais, o que dá quase 10% da população.
A entrada é monitadora por segurança privada. Depois de percorrer uma estrada de terra, cercada por uma vegetação rasteira, passa-se um heliponto até chegar à recepção, uma construção ao melhor estilo das mansões de praia: ampla, com pé direito alto e iluminação natural.
Um gramado que cerca a construção e é servido por um sistema de irrigação torna o ambiente um oásis no meio do solo pouco fértil desta região conhecida como Açu, que fica no 5º Distrito, no parte sul do município de São João da Barra. No ambiente com ar condicionado, que contrasta com o calor abafado do lado de fora, o painel exposto na parede impressiona pela quantidade de construções do complexo porto-indústria.
À frente dele, uma maquete, recentemente desatualizada pela decisão de erguer o estaleiro ali, que era disputado também por Santa Catarina. A construção tem ainda uma sala de cinema para pelo menos 50 pessoas, onde é projetado um filme os negócios do empresário, amplos banheiros, escritório e um pequeno alojamento. As pessoas que trabalham ali são simpáticas e atenciosas e exigem o cuidado com as normas de segurança numa obra desta magnitude.
Um vídeo com a imagem aérea da ponte dá a dimensão exata da grandiosidade. A ponte de três quilômetros do porto já atraiu a atenção de jornalistas do mundo inteiro. A rede de TV CNN sobrevoou a estrutura do porto de helicóptero. O jornal “Washington Post” esteve aqui chamando a atenção de que o empreendimento está saindo do chão por conta do interesse chinês em obter recursos naturais – minério de ferro é o principal deles.
Superporto do Açu: Metade da mão de obra contratada para as obras vem da região; Quando os projetos estiverem prontos, promessa é gerar 50 mil postos de trabalho
Na maioria das apresentações realizadas para investidores, a ponte é mostrada como o caminho para o
desenvolvimento de uma região, que deve gerar 50 mil empregos diretos quando tudo estiver pronto, segundo números divulgados pela empresa.
No estágio atual da obra, trabalham cerca de 2,5 mil pessoas, das quais mais da metade da região, principalmente nas funções mais básicas. Engenheiros e técnicos mais especializados foram “importados” e ocupam boa parte das pousadas da região.
As projeções divulgadas pela prefeitura indicam que a população de São João da Barra irá crescer dos atuais 32 mil para cerca de 250 mil pessoas em um prazo de até 15 anos. A prefeitura lançou um plano de obras de infraestrutura, com investimentos de R$ 80 milhões para os próximos anos, que inclui redes de água e esgoto.
Seis postos de saúde, cinco creches, duas novas escolas foram construídos. Abriram-se vagas para o ensino técnico voltado, por exemplo, para operadores logísticos e metal-mecânico. Além disso, 180 alunos estão tendo aulas de mandarim para comunicar-se com os chineses que vão trabalhar numa das duas siderúrgicas esperadas no complexo industrial.
Não à subhabitações
Para atender a demanda, a prefeitura calcula a construção de 84 mil novas unidades habitacionais. “Estamos nos preparando para atender esse forte crescimento e desenvolver o pessoal que aqui está”, diz a prefeita de São João da Barra, Carla Machado (PMDB). Mas ela adverte que não quer que o município acomode bolsões de pobreza, com o surgimento de favelas. “Quem vier para cá e se estabelecer em barracos será retirado”, afirma.
Para acomodar o crescimento populacional, o grupo EBX decidiu criar, do zero, a “cidade X”, uma área anexa ao complexo porto-indústria. O empreendimento tem meta de atender 250 mil pessoas, embora a prefeitura avalie que não será para mais do que 150 mil habitantes. Será desenvolvido pela REX, a empresa imobiliária da Eike.
Para tanto, o empresário convidou o arquiteto e urbanista Jaime Lerner, ex-governador do Paraná, para criar uma cidade modelo. “A ideia é garantir habitação com infraestrutura, de modo que o crescimento urbano seja planejado e ecologicamente sustentado”, explica a empresa. Uma das propostas em estudo é o uso de bicicletas e de carros elétricos. “Não queremos também que a cidade X seja um condomínio fechado”, diz a prefeita. “Não é possível ter um município fragmentado.”
Bebida milagrosa
Por anos, São João da Barra viveu de atividades pesqueira, pecuária e agrícola, como a cana de açúcar - até a falência das usinas existentes na vizinha Campos de Goytacazes. Tornou-se durante os anos 1970 e 1980 nacionalmente conhecida por causa da propaganda de um conhaque de alcatrão, fabricado pelo grupo Thoquino, conhecido como “o conhaque do milagre”, capaz de curar os males dos enfermos por artrite.
“Era a maior empresa de destilados do Brasil, até a entrada das companhias estrangeiras”, diz Victor Aquino, secretário de Planejamento de São João da Barra e um dos mais de 100 herdeiros do grupo de bebidas. “Fazia muito sucesso. Chegou ao “Guiness Book”, o Livro dos Recordes, como o conhaque mais vendido no mundo em número de doses”, orgulha-se Aquino, que, em seguida, faz a ressalva: “conhaque bom mesmo é vendido em garrafa”.
Atualmente, o município vive da atividade de turismo, com a vinda de hordas de mineiros para as praias de Atafona e Grussaí - curiosamente, o maior hotel do município, com 600 quartos, é o Sesc, de Minas Gerais, cuja cidade mais próxima fica a cerca de 200 quilômetros.
Mas o que mais gera receita e mantém a cidade é a receita oriunda dos royalties do petróleo retirado do campo de Roncador, um dos maiores da Petrobras, na bacia de Campos. As transferências de recursos garantem cerca de R$ 200 milhões do orçamento anual de R$ 250 milhões a ser realizado em 2010.
Arrecadação em crescimento
A prefeitura já nota aumento na arrecadação com o ISS, o imposto sobre serviços, por conta das transformações geradas pelo Porto de Açu. Em 2007, a receita com ISS foi de R$ 1,6 milhão, valor que chegou a R$ 8 milhões no ano passado. “Apenas o estaleiro do Eike vai gerar mais R$ 35 milhões em recursos próprios ao município”, diz Aquino, confiante de que o empreendimento dará à cidade de São João da Barra independência financeira. A prefeitura já prepara uma atualização do mapa de georeferenciamento para fixas novas cobranças de IPTU e ISS.
Victor Aquino, secretário de Planejamento de São João da Barra: "novo" Eldorado
Aquino diz que São João da Barra vive uma fase de “novo Eldorado” brasileiro. Ele nasceu em Campos, nunca trabalhou na fábrica da família e mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro há três décadas para estudar e trabalhar como arquiteto.
Conheceu Eike Batista quando o empresário fez um investimento na área de saúde e convidou o arquiteto para fazer um projeto de consultórios hospitalares. Há três anos, fascinado com o Superporto do Açu, Aquino decidiu voltar à região de São João da Barra e ajudar a implantar o empreendimento de Eike.
“Sou uma espécie de Severino, ajudando a destravar tudo”, brinca. “Aqui as oportunidades existem. Quem for um bom profissional se dará bem”, diz. Quando sair da prefeitura, ele mesmo espera colher essas oportunidades com seu negócio na área de arquitetura “Espero ganhar muito dinheiro no futuro, obviamente não serei um bilionário como o Eike”, diz.
O primeiro shopping da cidade começa a sair da maquete. A SuperBom, uma rede de supermercados de Campos, acena com a abertura de uma filial na cidade vizinha. A cidade tem duas agências bancárias, uma do Banco do Brasil e outra do Itaú. A Caixa Econômica Federal deve abrir uma filial, assim como se espera o mesmo do Bradesco e Santander.
Determinadas cidades nascem da junção de pessoas com empresas que buscam explorar seus recursos naturais. A mineira Ipatinga era uma cidade de 3 mil pessoas que cresceu à sombra da siderúrgica Usiminas. A cidade fluminense de Volta Redonda nasceu com a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). As duas cidades são consideradas exemplos do desenvolvimento industrial brasileiro.
Mas há casos de tremendo fiasco. Henry Ford, o empresário que revolucionou a indústria automobilística, criou uma cidade do zero no meio da floresta Amazônica para extrair das seringueiras o látex utilizado na fabricação de pneus aos carros que vendia nos Estados Unidos. A “Fordlândia” durou pouco mais de 15 anos e virou uma cidade abandonada perto de Santarém, no Pará. Delírio ou não da mente dos empreendedores, o tempo vai dizer se Eike Batista concretizará os projetos empresariais, transformando São João da Barra na sua “Eikelândia”.
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