A carreira técnica está em alta no mercado de trabalho brasileiro. Principalmente nas áreas de tecnologia e infraestrutura – justamente as que mais ficaram reprimidas durante a estagnação econômica das décadas de 1980 e 1990. Com a volta do crescimento do país, as empresas foram pegas no contrapé. As escolas e universidades não dão conta de formar gente suficiente para montar redes de computadores, construir hidrelétricas, automatizar supermercados ou trabalhar nas refinarias de petróleo. Há três tipos de profissional entre os mais disputados: os engenheiros, os tecnólogos (formados em um curso superior especializado) e os técnicos (que fizeram um ensino médio especial).
A carência nacional de engenheiros é expressa em números. O Brasil forma 38 mil novos engenheiros por ano. “Em 2016, o mercado vai precisar de 80 mil por ano”, diz Murilo Pinheiro, presidente da Federação Nacional de Engenharia. Ele acredita que, até lá, quem tirar um diploma técnico dificilmente ficará sem emprego.
O paulistano Marcelo Mancini, de 26 anos, sabia disso quando optou pelo curso de engenharia ambiental, concluído em 2010, na Universidade São Marcos. Mas diz que ficou surpreso quando, recém-formado, conseguiu uma vaga em um concurso na mineradora Vale. Sem nenhuma experiência na área, foi contratado como responsável pela gestão de informações de novos projetos da Vale. Nos últimos 15 meses, o número de engenheiros contratados pela empresa aumentou 50%.
Não é preciso ter um diploma de um curso tradicional de engenharia para ingressar numa carreira técnica. Existem atalhos para o aluno chegar mais rápido ao mercado de trabalho. O primeiro são os cursos superiores de tecnologia, que forma os tecnólogos. O número de vagas e de formados explodiu nos últimos cinco anos. São cursos mais curtos (duram dois anos, ante os cinco da engenharia). Têm currículos mais práticos e sob medida para algumas funções, como o tecnólogo em geoprocessamento, que analisa imagens de satélite para monitoramento ambiental ou planejamento urbano. “Por isso, esses cursos são tão atraentes para quem quer ou precisa começar a trabalhar logo”, diz Angelo Cortelazzo, coordenador da área de ensino superior do Centro Paula Souza, de São Paulo. Para quase 90% dos que se formam tecnólogos pelo Centro, há emprego garantido. Alfredo Xavier Bittencourt, de 21 anos, se formou tecnólogo em desenvolvimento de sistemas e hoje trabalha na IBM. Antes de se formar, ainda durante o estágio na empresa, em 2009, foi convidado para trabalhar como efetivo. “Os cursos de bacharelado que pesquisei antes de fazer o tecnológico eram muito teóricos. Optei pelo que dava garantia de emprego”, diz.
O segundo caminho para a carreira tecnológica começa mais cedo, nas escolas técnicas de ensino médio. Para o aluno, a vantagem é ganhar conhecimento e se preparar melhor caso haja interesse em tentar uma vaga numa faculdade de engenharia ou de tecnologia. Com formação técnica na área de eletrônica, o analista de sistemas Eliseu Junior, de 32 anos, não queria depender de uma faculdade para conseguir seu primeiro emprego. Cinco anos depois do ensino médio, já trabalhando na HP, Junior se formou tecnólogo em gerenciamento de redes pela Universidade Paulista. “Tinha começado antes um curso de engenharia de telecomunicações, mas desisti. Não consegui conciliar com o trabalho.”
Além da recessão econômica nos anos 1980 e 1990, o preconceito ajudou, em boa medida, a reprimir o avanço da carreira de nível técnico. Por muito tempo, o técnico era visto como mal qualificado, de baixa escolaridade. Fora a imagem de carreira “masculina”, que ainda afasta talentos femininos. “Muita empresa não sabe o que os tecnólogos fazem”, afirma José Paulo Garcia, presidente do Sindicato dos Tecnólogos de São Paulo. Não é chororô. A Petrobras não contrata tecnólogos para as áreas principais de seu negócio. Seus fornecedores, sim. “Mas não há escapatória”, diz Marcelo Braga, sócio da Search, consultoria de recursos humanos de São Paulo. “A saída para o Brasil construir e desenvolver o que é necessário para garantir o crescimento econômico são os tecnólogos.” Os países mais desenvolvidos apostaram na formação desse tipo de profissional para avançar econômica e tecnologicamente. No grupo de países ricos, 30% de quem fez curso superior é tecnólogo. No Brasil, são 12%.
É claro que a qualidade dos cursos pesa. A maioria dos tecnólogos se forma por faculdades particulares, muitas com baixa qualidade de ensino. Mas o risco de uma formação ruim não é exclusividade desse tipo de profissional. Mais de 70% dos engenheiros brasileiros se formam nas escolas com pior avaliação pelo Ministério da Educação, de acordo com um levantamento feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Em dez anos, o problema será a qualidade dos engenheiros, e não a quantidade”, diz o analista Paulo Nascimento, do Ipea.
Fonte: Revista Época edição 701 (24 de outubro de 2011)